ENSINO A DISTÂNCIA DEVE GANHAR FORÇA NOS PRÓXIMOS ANOS

O ensino a distância tem ganhado cada vez mais destaque na educação superior. Nos últimos anos, a oferta cresceu exponencialmente. Em 2010, só existiam 10 cursos no Brasil. Em apenas sete anos, esse número passou para mais de 2 mil, sendo que 97% é ofertado por instituições particulares. O crescimento se reflete na oferta das bolsas do Programa Universidade para Todos (ProUni). O número de municípios ofertando cursos a distância por meio do programa subiu 39% no segundo semestre de 2019 em relação ao mesmo período de 2018.

Enquanto isso, o ensino presencial deu uma estagnada nos últimos anos. É isso que faz o Ministério da Educação (MEC) acreditar que a modalidade crescerá e ganhará destaque na formação dos profissionais. O panorama, com base no Censo da Educação Superior, foi apresentado durante o 12°Congresso Brasileiro da Educação Superior Particular (Cbesp), que ocorreu em Belo Horizonte (MG), entre 6 e 8 de junho.

De acordo com Marcos Heleno Guerson de Oliveira Júnior, diretor de política regulatória da Supervisão da Educação Superior do Ministério da Educação (Seres/MEC), a EAD é a única solução para democratizar o acesso ao ensino superior. “Temos mais de cinco mil municípios e uma reduzida minoria deles  tem cursos presenciais. Não há solução para interiorização que não seja a EAD. Mas não só para o interior; quando pensamos em São Paulo, por exemplo, quem  hoje tem condições de ficar três, quatro  horas no trânsito para ir à aula?”, questionou.

A questão da mobilidade foi exatamente o que fez Gabriel Soares, 23 anos, optar pelo ensino a distância. Morador do Gama, ele faz administração e marketing no Centro Universitário de Brasília (UniCeub). “O descolamento é muito difícil e me surgiu essa oportunidade de fazer a distância”, lembra. Além das graduações, Gabriel trabalha como consultor de marketing. “Eu sou uma pessoa muito agitada, não consigo me sentar em uma sala e ficar recebendo informações. A EAD tem a vantagem de você ter que ser ativo no aprendizado e correr atrás para desenvolver o aprendizado”, afirma.

Segundo o professor da Universidade de Brasília (UnB) Paulo Roberto Affonso Marins, que coordena o projeto de pesquisa  “Inovação Tecnológica no Ensino de Música a Distância”, o crescimento da modalidade é pela junção de dois fatores. “Pela flexibilização de tempo e espaço e pelo baratemento. A mensalidade da EAD gira em torno de R$ 265. O público da modalidade são egressos do ensino médio que não ingressam imediatamente no ensino superior e que trabalham ou querem trabalhar”, explica.

O graduado em administração pela Unopar Vitor Hugo Noinann Junior, 39 anos, gerente de serviços em uma escola canadense, optou pelo curso a distância pela economia. “Eu estava passando por uma  situação financeira complicada, não ganhava suficiente para bancar meu deslocamento para uma faculdade presencial. Então, abriu um polo perto da minha casa que dava para ir andando. Eu acabei optando mesmo sem conhecer”, conta.

Para ele, a escolha foi acertada. “Acho que não faz tanta diferença. As aulas existem e você pode  assistir até 20 vezes se precisar. Eu tenho dificuldade de aprendizado, então, para mim, foi muito bom”,  ele afirma.

Mas as críticas à modalidade também não são poucas. Os que não aprovam apontam a dependência do meio tecnológico como problemático, afinal, mais de um terço dos domicílios brasileiros ainda não têm nenhuma forma de acesso à internet, segundo a pesquisa TIC Domicílios 2017. O número chega a 70% nas classes D e E. Além disso, a modalidade exige  esforço e dedicação maiores do aluno.

Uma pesquisa feita em 2018 pela Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES)mostrou que  44% dos entrevistados optariam por essa modalidade, enquanto 56% dizem que preferem o ensino presencial. Para 7% dos participantes, o ensino a distância não é uma opção. Entre eles, 62% acreditam que a qualidade dessa modalidade não é bem avaliada no mercado de trabalho.

Ensino a distância deve ser simplificado
O maior crescimento da modalidade foi registrado de 2016 para 2017, quando teve um aumento de mais de 17,6%. Esse crescimento se deve em grande parte pelo Decreto Nº 9.057/ 2017, que facilitou a abertura de polos. A defesa de Marcos Heleno é que a legislação vigente seja menos burocrática e dê mais liberdade para o setor crescer. “Minha intenção é começar uma discussão com as instituições.  A ideia não é regular ainda mais, a ideia é desregular, mas tem que ter qualidade”, afirmou.

O Secretário substituto do Seres/MEC, Marco Aurélio de Oliveira, que participou do evento substituindo o secretário Ataíde Alves, disse que o governo quer desburocratizar ao máximo a modalidade. “A gente está buscando o entendimento de que a educação é uma só, independentemente de ser presencial ou a distância.”

E os primeiros passos para isso já foram dados. O secretário substituto Marco Aurélio anunciou que o MEC reeditará a  Portaria n° 1.428/2018 que amplia de 20% para 40% o limite de disciplinas EAD para cursos de graduação presencial e aproveitará para diminuir a regulação. O que exatamente será desburocratizado, o secretário não quis explicar. “Ela estava se sobrepondo a outras portarias que existiam, então vai entrar uma mais racional, que irá manter a possibilidade de 40%. Na prática, foi feita de uma forma mais técnica. Nesse momento, eu prefiro não dizer o que mudará, porque ainda irá passar pela apreciação do ministro”, explica.

Além disso, Marco Aurélio afirma que o órgão está empenhado em procurar soluções para diminuir a influência do Estado. “Nós estamos com orientações do ministro no sentido de trabalhar a desburocratização, de ser um pouquinho mais racional. Com pequenos ajustes na legislação vigente, a gente consegue bons resultados. Instituímos grupos de trabalho para destravar algumas pautas. Trabalhar no sentido de diminuir o peso do Estado”, disse.

Essa menor regulamentação também é defendida pelas instituições de ensino superior, e não só para a educação a distância. “Se a pessoa decide empreender no Brasil e escolhe investir em educação, será que essa pessoa está mal-intencionada? Em princípio, acho que não. Há formas de  simplificar, que não é abolir  a regulamentação”, afirma Celso Niskier, secretário executivo do Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular  e diretor presidente da  Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior  (ABMES).

Entre os pedidos, está o de autoavaliação e que prazo para recadastramentos das instituições seja maior e de simplificação dos processos, que Niskier afirma que já foram levados ao ministro. “Este é um bom momento para falar de liberação na educação”, defende.

Ensino a distância tende a continuar crescendo
O MEC afirma que a educação superior dependerá muito da modalidade. “Muito do futuro da educação superior está ligado à educação a distância. Hoje, 39% dos jovens que terminaram o ensino médio não estão na faculdade”, aponta Marcos Heleno.

A grande maioria dos cursos ofertados a distância são pelas instituições particulares. Cerca de 37% dos alunos matriculados no ensino superior particular estão no ensino a distância. “Eu acredito que, em poucos anos, a maioria estará no EAD. E, se a tendência é esse crescimento, a indicação é que essa demanda bata no setor privado”, salienta Marcos Heleno. Ao todo, 33% dos ingressantes na graduação estão indo para o ensino a distância.

Para se ter uma ideia, um pouco mais da metade das bolsas integrais em instituições particulares de ensino ofertadas pelo Programa Universidade para Todos (ProUni), este semestre, são em cursos a distância. Ao todo, estão sendo ofertadas 68.087 bolsas integrais para o segundo semestre deste ano. Dessas, 34.903 são em cursos a distância.

Segundo o professor Paulo Roberto Affonso Marins, o motivo para esse movimento não está tão  presente nas instituições públicas: é a falta de políticas públicas. “Eu acho que ainda falta incentivo. Tem um pouco de preconceito. Tem a portaria que autoriza até 40% a distância, mas quase ninguém usa. Nas particulares, tem a questão de diminuir os valores  das mensalidades”, explica

Além disso, um estudo apresentado no 10° Encontro Internacional de formação de professores apontou que cerca de 20% dos professores/tutores não estão totalmente seguros quanto ao uso de suas metodologias e recursos tecnológicos voltados para o ensino a distância.
 
Formação de professores em pauta
Uma  grande parcela dos cursos ofertados a distância são de licenciaturas. Nas instituições particulares, pedagogia é a graduação com mais matriculados na modalidade. Nas públicas, é o curso que fica em segundo lugar. A formação de professores já é feita quase que 50% a distância.

“O sistema Universidade Aberta do Brasil, de 2005, era uma indução para formar professores da educação básica, inclusive o primeiro vestibular para cursos a distância foi para licenciaturas”, lembra Paulo Roberto Marins, que foi coordenador do curso de licenciatura em música a distância da UnB. Porém, existem muitas críticas em relação à formação desses profissionais. “As críticas são calcadas em preconceitos. Quando se compara a performance dos estudantes no Enade, se vê que não são muito diferentes. Na licenciatura, os alunos têm que fazer a prática, mas, para o que não se consegue fazer pela internet, têm os encontros presenciais nos polos”, defende.

O programa Universidade Aberta do Brasil (UAB) foi criado com o intuito de  oferecer formação inicial a professores em efetivo exercício na educação básica pública, porém ainda sem graduação, além de formação continuada àqueles já graduados. Ainda hoje, existe um deficit de professores formados atuando na educação básica. Uma média de quase 50% dos profissionais que atuam em salas de aula não têm formação adequada para a disciplina, ou mesmo não são graduados.

Nesse sentido, das 204 mil matrículas na UAB, 85% são ocupadas por professores da educação básica. Atualmente, são 777 polos, sendo que 582 estão em municípios com menos de 100 mil habitantes

Agora, o Centro de Ciências Computacionais da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), em parceria com a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), pode expandir o alcance da modalidade de ensino a distância para  locais sem internet ou com conectividade limitada. A iniciativa se chama AVAPolos e é uma ferramenta que funciona 100% off-line.

 

  

Fonte: ABMES